07 julho, 2009

Entrevista feita pelo Jornal da Bairrada - época 2008/2009

Entrevista feita pelo JB - Manuel Zappa, ao treinador do Oliveira do Bairro Sport Clube, Amorim Nunes.


1-Que balanço fazes desde que assumiste o comando técnico do OBSC?

Posso dizer que o balanço foi muito positivo. Foi gratificante sentir que não estávamos sós.
Sabíamos que ao partir para a 2.ª volta com unicamente 10 pontos, a tarefa era muito difícil.
Mas, quando consegues sentir e ver:
A Comissão Administrativa tudo fazer para que o trabalho fosse desenvolvido com tranquilidade;
A Autarquia de uma forma muito vincada e colaborante, bem como empresas e gente anónima a dizerem presente nos momentos difíceis;
Os sócios e simpatizantes a, diariamente, terem manifestações de incentivo para connosco;
Que da parte clínica existia empenho total na recuperação imediata dos lesionados;
Que dentro das possibilidades permitidas pelo estado do tempo, o qual em determinada altura foi bastante adverso, os responsáveis pelo tratamento do relvado tudo fazerem para que o mesmo se apresentasse em boas condições para a realização de jogos e treinos;
Os jogadores serem de uma entrega, empenho, dedicação e compreensão dignas de registo;
Ter sempre a meu lado o Prof. António Augusto que com o seu saber e competência acumulados foi peça fundamental para alcançarmos os nossos objectivos.
E além do que atrás disse, consegues atingir plenamente os objectivos desportivos que era a manutenção a tempo e horas, o que nos permitiu nas últimas duas partidas proporcionar competição e tempo de jogo aos jogadores menos utilizados, só posso dizer que o balanço foi muito positivo.


2-Qual foi o segredo e do percurso quase imaculado na segunda volta onde nos últimos dez jogos a equipa perdeu apenas uma vez (Fátima)?
No dia em que fui apresentado como treinador principal disse ao grupo que não tinha na minha posse fórmulas mágicas para resolver os nossos problemas, mas que teríamos forçosamente que ser mais eficazes tanto no processo ofensivo como defensivo e que iríamos tudo fazer para que isso viesse a ser uma realidade. Pedi-lhes disponibilidade e eles deram-na sem qualquer objecção, pois também sabiam que só seria possível ganhar jogos se todos desse-mos mais um pouco de cada um.
Os dados diziam-nos que a realidade era complicada e que seria necessário estarmos muito disponíveis e permanentemente convocados.
Parece-me hoje, que o segredo foi não haver segredo. Tentámos ser simples, coerentes, entendíveis, respeitadores, transmitindo aos jogadores estabilidade, segurança, tranquilidade e confiança. O resto, eles fizeram e fizeram muito bem.

3-Cada treinador tem a sua concepção técnico/táctica. A principal mudança na estrutura da equipa prendeu-se com a entrada de Rato. O jogador transfigurou-se, a equipa também. Esta foi a principal arma para a recuperação ou houve outras?
Vejo as coisas mais pelo prisma do sucesso colectivo e não pelo sucesso individual. Também é verdade que o sucesso individual e os níveis de auto-estima individual em alta só vêm ajudar para o colectivo. No entanto, o Rato foi importante como todos foram importantes. Foi bom para ele a entrada na equipa e ter sido feliz; com isso ganhámos todos.
De uma forma simples, insistimos na sistematização de processos e assentámos numa equipa tipo; tentámos maximizar as nossas competências e as nossas coisas boas, minimizando ou escondendo do adversário as coisas menos boas e as nossas debilidades, no sentido de nos tornarmos mais fortes cada dia que iam passando.
Acreditámos que era possível fazer coisas boas e isso veio a acontecer.
Até parece que foi fácil, mas só com muita vontade, muito querer e com uma perseverança ilimitada foi possível chegar a bom porto.


4-Pior e melhor momento da época?
Para mim, tivemos vários “piores” momentos. Sempre que ficávamos mais debilitados, por lesões, castigos ou impossibilidade de algum jogador treinar, para mim era um muito mau momento.
Por exemplo, utilizei o Éder 15 minutos no primeiro jogo como treinador principal do OBSC; no final disseram-me que até ao final da época teria que viver sem ele; no mesmo jogo o Carlos Miguel saiu lesionado aos 35 m e no jogo seguinte em Penalva saiu ao intervalo por agravamento da lesão; ficámos em ele para os jogos com o Pampilhosa e com o Operário, tendo voltado à equipa com o Fátima. Na semana seguinte lesionou-se com gravidade. Nunca mais contámos com ele e ainda faltavam 5 jornadas para acabar a 1.ª Fase. Sabia que em 18 jogos o Carlos só participou em 3 fazendo unicamente 1 completo?
Piores momentos foram também com o Operário, quando de uma assentada ficámos sem o Barreto, Miguel e o Xavier, com o Pampilhosa quando o Branco foi expulso no início da segunda parte, com o Eléctrico quando, ainda antes do intervalo o Rui Castro foi expulso e finalmente quando no Praiense o Ivo foi expulso aos 12 minutos de jogo.
E que dizer quando o Mário Júlio e o Xavier foram para o hospital, fruto da entrega que colocaram no trabalho, e quando o Prof. teve que se operado ao tendão de Aquiles. Todo o grupo sentiu que eram “piores” momento.
Pior momento foi também, os treinos em que, por motivos profissionais alguns jogadores não podiam treinar.
E para finalizar, pior momento foi inclusive no Monsanto; nesse jogo não nos sentimos recompensados por aquilo que fizemos. Não ser apurado para a fase dos primeiros por mero factor de desempate, foi frustrante.
Foi preciso saber sofrer e arranjar forças para começar de novo, quando às vezes as coisas pareciam estar muito complicadas.
A todas estas adversidades os jogadores responderam com entrega, mestria e muita competência, o que nos deu o prazer de saborear vários bons momentos.
Como melhores momentos saliento todos aqueles em que o grupo sentiu a felicidade de ter sucesso. Crescemos como grupo ao participarmos na felicidade e no infortúnio de cada um. Sempre que conseguíamos dar mais um passo rumo ao objectivo delineado, ficámos satisfeitos.
Depois de contornar todas as dificuldades de percurso foi muito bom ver a satisfação de todos os Oliveirenses no final do jogo com o Nelas, quando conseguimos garantir a manutenção.


5-O OBSC é um clube sui-generis pelo ambiente quase familiar que tem sido criado ao longo dos anos no balneário. Foi fácil treinar e orientar este grupo de trabalho?
É verdade. Temos um ambiente praticamente familiar, O grupo sente o problema de cada um, vive preocupado com as dificuldades individuais, quer sejam do foro profissional, familiar, desportivo ou outro, sabe sofrer e ser solidário quando é preciso e festeja o sucesso de cada elemento que compõe o OBSC como sendo seu.
Mas isso, acontecer no Oliveira do Bairro não é surpresa, pois foi praticamente sempre assim desde tempos imemoriais.
Senão, veja-se, a título de exemplo, ainda no último aniversário do Clube a homenagem merecida que foi prestada a antigos jogadores do OBSC. Isto não ocorre em qualquer clube. O OBSC é um clube com memória.
O “balneário” deste ano soube estar sempre preparado para o imprevisto, partindo do pouco (cada acção, cada comportamento, cada gesto) para o todo (sucesso colectivo), sendo importante manter e reforçar a dinâmica relacional que tem vindo a ser desencadeada no interior do grupo do OBSC ao longo dos anos.
E quando existe assim uma conjugação de factores potencializadores de situações positivas, se não inventares e souberes estar, fazendo com competência o que deves fazer, é fácil treinar e orientar gente assim.
Os jogadores sabiam que todas as opções da equipa técnica seriam sempre em função do que pensávamos ser o melhor para o grupo e que, independentemente de jogarem pouco ou muito, serem titulares ou não, teríamos por eles o mesmo respeito e admiração. Uma equipa não se faz só de titulares e os que não jogam tão assiduamente merecem por direito próprio a mesma atenção dos outros.


6-Há quem diga, e é uma verdade, que há jogadores quase em final de carreira, na casa acima dos 30 anos. Como perspectiva uma futura renovação?
Aqueles que hoje estão acima dos 30 são praticamente os mesmos que já há quatro/cinco anos estavam rotulados de velhos, e daí para cá tem continuado, como maior ou menor dificuldade a contribuir para a manutenção do OBSC na 2.ª divisão e, importa realçar e relevar que o OBSC é o clube a nível nacional que mais tempo tem ininterruptamente de 2.ª divisão e isso só foi alcançado com a dedicação de muita gente. Entraram e saíram jogadores, treinadores, dirigentes e outros colaboradores; acredito que todos deram o seu melhor e com isso contribuíram com a sua quota parte para este registo.
Temos o dever de ser gratos, mas essa gratidão não pode nem deve hipotecar ou condicionar o clube ou quem o dirige. O clube deve estar sempre acima de vontades individuais.
Todavia, também sabemos que ninguém é eterno, mas no tempo devido as coisas rumarão de forma natural. Os mais velhos já deram muitas alegrias ao clube e, até, só por isso, merecem respeito e que cada situação individual seja tratada com a devida atenção e cuidado.
Saberão sair sem que precisem de ser empurrados e, penso que poderão ser aproveitados, na altura própria, para outras tarefas no clube, Não é hostilizando e dividindo mas sim juntando, que poderemos continuar a fortalecer o OBSC.
Tanto ou mais importante que uma renovação etária, é preciso que seja feita, em cada ano que vai passando, uma renovação de mentalidades. Custa-me aceitar que um jogador com trinta e pico anos seja considerado velho e a precisar de reforma, como não concebo porque é que um jogador com 22/23/24 anos ainda há-de ser encarado como “miúdo”.
Para mim, há jogadores que compõem o plantel e compete ao treinador escolher os que melhores condições reúnem para o sucesso colectivo independentemente da idade.

7-Se continuares, o que será necessário no reforço da equipa, principais lacunas, aposta ou não na formação?
Continuando ou não, o OBSC não pára e todos sabemos que o próximo quadro competitivo, embora ainda não esteja aprovado, apontará para a criação de três zonas e com a descida automática de seis equipas (previsão). Isto por si só leva a que sejam tomadas as devidas e acauteladas decisões quanto ao futuro do OBSC. Todos sabemos que não será tarefa fácil.
Há que prevenir, criando condições para que o plantel actual possa vir a ser pontualmente reforçado. Também sabemos que o OBSC está a viver no limite das suas possibilidades e que a crise se tem feito sentir de forma acentuada na angariação de fundos. Vamos ver o que se pode fazer.
A actual Comissão Administrativa pela voz do Sr. Dr. Carlos Ferreira teve o cuidado de, em tempo oportuno, comunicar a todo o grupo, que, em princípio, é intenção do OBSC contar com todos para o próximo ano, dando a conhecer o ponto de situação em relação à constituição da próxima direcção e pedindo que, caso aparecesse alguma proposta de algum clube, aos actuais dirigentes fosse dado conhecimento.
Quanto a apostar na formação, mais que as palavras, os actos falam por si. Não consigo encontrar nenhum clube que tenha apostado, ao longo de toda a sua história, tanto na formação como o OBSC.
Este ano, durante muito tempo, assentámos numa equipa tipo. Sabe que dessa equipa tipo faziam parte o Paulo Costa, Leandro, Tó Miguel, Rato, Hugo Paulo, Dani e o Barreto? São só 7!; e sabe que, além desses, ainda há mais jogadores da formação no plantel? E que a maior parte dos restantes já fazem parte do clube há mais de uma dezena de anos, com raízes criadas aqui?
Mas todos eles não jogaram por serem da formação ou não, por serem mais velhos ou mais novos. Jogaram porque mostraram valor e competência e porque em determinada ocasião e perante determinado desafio entendemos que seriam os que melhor responderiam às nossas necessidades.

8-O teu objectivo é continuar?
Defendo que a vontade individual é muito importante, mas nunca deve condicionar o que deve ser a vontade colectiva.
Cada coisa no seu lugar. Primeiro deverá ser encontrada solução na esfera dirigente. Penso que quem quer que venha a dirigir os destinos do clube, não deve estar de alguma forma condicionado nas suas opções.
Neste caso, a continuidade da actual equipa técnica liderada por mim, deverá resultar de uma conjugação de vontades e disponibilidades.
Penso que, como tudo na vida, isto no futebol também tem carácter mutável e transitório; tem regras próprias e quem não estiver preparado para sair no imediato, sem traumas, litígios e azedumes, também não tem condições para entrar e permanecer; sei perfeitamente que um dia deixarei de ser o treinador do OBSC e que vários factores poderão contribuir para isso, nomeadamente resultados desportivos (se forem bons poderão fazer projecção superior, se forem menos bons poderão forçar saída), entendimento comum ou objectivos diferentes, tanto a nível individual como de clube. Todavia, quando isso acontecer, seguirei o meu rumo sem quaisquer ressentimentos.
O meu verdadeiro objectivo desportivo é viver com intensidade cada momento que a competição me dá, enriquecendo os conhecimentos com as experiências que cada um me proporciona, sabendo que uma das únicas formas de ser feliz é ir encerrando ciclos, fechando portas e terminando capítulos, e que isso seja feito com a consciência do dever cumprido. É sinal que andamos cá, nesta vida, a fazer algo de válido que nos dignifica pessoalmente bem como a instituição que servimos. E o OBSC merece.

9-Sabemos que o teu nome foi ventilado para treinador de outras equipas, nomeadamente para uma equipa dos Açores. O que dizes a isso?
Sendo treinador e querendo continuar, ambição não me falta e saberei analisar devidamente o que surgir, se surgir.